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quarta-feira, 30 de julho de 2014

Páginas de combate - o retorno (literalmente)

No sábado retrasado faleceu Rubem Alves, um dos grandes e mais respeitados escritores brasileiros. Apesar de ser seu sobrinho-neto, confesso que tenho pouca intimidade com as obras dele. O que conheço de seu pensamento vem da leitura que fiz de seus artigos e das palestras e entrevistas às quais assisti, especialmente sobre educação. Sempre me admirei de suas propostas para a educação. Suas opiniões nesse assunto sempre me pareceram muito válidas e coerentes. Coincidência ou não, estudei minha vida inteira em uma escola alternativa, daquelas que seguem os modelos de Piaget e Paulo Freire, muito em sintonia com as propostas que o próprio Rubem fazia.

Graças a isso, cresci sem saber direito o que era o “modelo tradicional” de escola que ele e os professores de minha escola tanto criticavam. Passei minha infância e adolescência inteira ouvindo que a escola deve ser um lugar que desperta o senso crítico, que o aluno deve ser sujeito do aprendizado, que o professor deve auxiliar o aluno a chegar ao conhecimento por conta própria e que a escola deve preparar para a vida, e não para o vestibular. Acho que isso explica o tremendo enfado com que sempre aturei as aulas da licenciatura nos dois últimos semestres. As matérias da FaE (Faculdade de Educação) nunca foram para mim nada mais do que um interminável e insuportável repeteco de tudo aquilo que eu havia ouvido na escola a vida toda. Cada disciplina parecia uma eterna compilação de truísmos iguaizinhos aos que eu havia visto nas outras disciplinas, só que com palavras diferentes. Não por acaso, várias vezes pensei seriamente em desistir da licenciatura, com medo de não aguentar aquela monotonia até o fim.

Bom, mas eu não estou aqui para falar da FaE, que já me consumiu tempo o bastante.

Apesar de conhecer muito pouco da obra de Rubem Alves, lembro-me bem de uma das últimas entrevistas que ele concedeu, quando já estava bem debilitado, em um documentário que a TV Câmara fez sobre sua vida. Em determinado momento do documentário ele afirma que um dos maiores erros que alguém poderia cometer seria voltar, após muitos anos, a um local marcante de sua infância e juventude com a esperança de matar as saudades. Isso porque quase sempre voltamos àquele lugar esperando reencontrá-lo tal como ele era antes. Esquecemo-nos de que esse lugar mudou, nós mudamos, as pessoas com quem convivemos nele mudaram (ou sequer estão mais ali). Como resultado, tudo o que encontramos é um local estranho, que pouco ou em nada nos lembra daquele espaço que esperávamos reencontrar.

Pois há apenas um mês atrás eu tive essa experiência monumental de voltar a um lugar que marcou minha juventude. 10 anos depois de ter colocado meus pés na Malásia pela primeira vez, aproveitei as férias da Copa do Mundo e uma passagem barata e resolvi retornar à minha segunda terra natal, onde passei 12 dos mais marcantes meses da minha vida. A Malásia foi minha primeira experiência internacional e minha primeira experiência de longa duração longe da família. Logo em minha primeira viagem internacional fui bater em terras tão longínquas para ficar não 1 ou 5 meses, mas um ano!

Era o que eu mais queria: retornar a esse país no qual eu havia crescido e aprendido tanto. Mais do que visitar outros países, mais do que conhecer outros lugares, o que eu sempre quis mesmo foi retornar àquela jovem monarquia do Sudeste Asiático que eu já havia aprendido a amar como se fosse o meu próprio país. Tudo que aconteceu comigo desde o fim da minha adolescência girou em torno disso: meus relacionamentos, meus estudos, minha vida acadêmica e profissional. De uma forma ou de outra, todas as decisões e experiências, decepções e triunfos, tudo que me aconteceu desde meu retorno ao Brasil em junho de 2005 sempre remeteu ao meu aprendizado na Malásia. Correndo o risco de uma comparação grosseira, diria que esse intercâmbio foi, para mim, o mesmo que a Revolução Francesa foi para a história ocidental.

“Mas o que tem nessa Malásia que te deixa assim, Marcelo? Quero conhecer esse país também!”, muitos devem querer me perguntar. Pois eu respondo: não há nada de especial. Vocês podem visitar o país, pode até ser que gostem. Mas o que me atrai tanto nele é a lembrança que guardo dele até hoje. Graças a isso, toda visita que eu eventualmente fizer àquele país sempre terá um significado especial, totalmente diferente da que outras pessoas terão.

No momento em que coloquei os pés na Malásia pela segunda vez, simplesmente não consegui acreditar. Desde que voltei ao Brasil sonhei tantas vezes que estava voltando pra Malásia que, quando se tornou realidade, fiquei até desconfiado. E confesso que até o segundo ou terceiro dia, continuei desconfiado, sem acreditar que aquilo estava acontecendo. Ao pegar o trem expresso do aeroporto até a estação central de Kuala Lumpur, derretia-me vendo aquelas paisagens típicas: as mesquitas, os templos hindus, as plantações de óleo de palma... Apesar de estar tão distante de casa, poucas vezes na vida me senti tão em casa quanto nas minhas primeiras horas na Malásia. Parecia até que eu estava voltando pra casa depois de alguns anos viajando pelo Brasil.

Pegando o trem da estação de Kuala Lumpur para Klang, sofri de algo que ainda não sei bem o que é. Creio que saudades antecipadas. Havia acabado de chegar ao país, mas quase morri de desgosto ao pensar que teria de deixa-lo após duas breves semanas. Via as estações de trem no quadro e me contagiava de nostalgia. Eram as mesmas estações de 10 anos atrás. O trem, porém, havia mudado: os vagões eram mais modernos e bonitos, e havia até vagões especiais para mulheres – que, curiosamente, não eram isolados dos vagões normais. Quando o trem parou na primeira estação e as portas se abriram, eu, bem posicionado em frente delas, senti aquele ar quente de mormaço e aquele cheiro de curry pela primeira vez em muito tempo, vindo bem em cima de mim. Fui tomado por uma felicidade inexplicável. Perguntei a mim mesmo: “O que é que eu tinha na cabeça quando deixei esse país?”.

O trem seguiu em frente. Em menos de uma hora estava em Klang, a cidade onde havia vivido e onde iria ficar novamente. Desci carregando minha mala e, antes de mais nada, fiz questão de tirar aquela selfie em frente à placa da estação – não podia faltar. Peguei o táxi até a casa da família que havia me hospedado nos primeiros meses de meu intercâmbio, e que iria me hospedar novamente. No caminho, fui vendo todas aquelas paisagens às quais me acostumara: o palácio do sultão, os restaurantes de comida indiana, o hospital Tengku Ampuan Rahimah e, enfim, a casa onde havia morado. Logo que apontei no jardim, a primeira coisa que ouvi deles foi: “Mas você não mudou nada, hein?”. Ouvi a mesma frase de quase todos que reencontrei, além de uma outra, ainda mais frequente: “Mas justo agora que todo mundo quer estar no Brasil para ver a copa você resolve vir para a Malásia?!”.

A Malásia é composta por basicamente três etnias: malaios, chineses e indianos. Lá, porém, não houve a atuação decisiva do sangue lusitano para “amolecer” a rigidez das divisões raciais e fazer emergir a miscigenação tão celebrada por Gilberto Freyre. O país é praticamente formado por três países dentro de um só. Essa família na qual fiquei era uma rara exceção: a mãe era malaia, muçulmana, e o pai indiano, convertido ao islamismo antes de se casar com ela. Eles tinham duas filhas. Nenhuma delas usava o véu há dez anos atrás. Agora, porém, a mais nova estava usando.

Após tomar um lanche com eles, fui tomar um banho. Na Malásia é costume encher o balde e tomar banho de caneca. Eu estava suado e cansado da viagem. Quando derramei a primeira caneca de água gelada sobre mim, novamente fui tomado por uma euforia indescritível. A única coisa em que conseguia pensar era: “Nunca mais! Nunca mais saio daqui...! Quero passar a eternidade aqui!”.

Lá estava eu, no mesmo quarto, no mesmo banheiro que eu havia usado dez anos antes. Eles estavam exatamente da forma como eu os havia deixado. Parecia até que estavam ali a me esperar, pacientemente, por todos esses anos.

Mas nem tudo estava igual. Notei que essa família estava bem mais religiosa do que da última vez. Eles passavam quase o dia todo assistindo a um canal islâmico na TV a cabo que transmitia orações, sermões e discussões em torno de história religiosa e do Alcorão. Em certos momentos do dia todo mundo desaparecia, recolhendo-se aos seus respectivos quartos: era o momento da oração para Meca. Parecia que todo mundo havia sido abduzido. A casa, muito escura por causa da pequena quantidade de janelas, ficava vazia e sombria. Nesses momentos eu aproveitava para andar pelas salas, observando tudo cuidadosamente, matando saudade de cada espaço. Mas pouco tempo depois todos reapareciam e nós comíamos!

Aliás, na minha primeira noite de volta à Malásia, tive um dos melhores jantares da minha vida. Uma das coisas da qual mais senti falta no país foi, sem dúvida, a comida. Passei os últimos nove anos de minha vida imaginando quando eu iria comer aquela comida de novo. No meu primeiro jantar, comi o famoso nasi lemak, um dos pratos tradicionais: arroz, pepino, frango e anchovas num molho vermelho muito, mas muito apimentado. Uma delícia! Comi com gosto, como em uma tentativa de matar toda a minha saudade. A pimenta desceu ardendo até meu estômago. Meus olhos lacrimejavam de dor e alegria ao mesmo tempo. Aliás, em meus primeiros dias eu comi tanta coisa e com tanta tenacidade, que tive uma dor de intestino infernal. Por um ou dois dias achei que ia explodir. A comida malásia é tão apimentada e saborosa, que agora que voltei ao Brasil tenho sérios problemas para me reacostumar. Tudo parece tão sem-graça e insípido, que muitas vezes parece que estou comendo e não estou me satisfazendo.

Mas – pimentas e comidas à parte –, quem não gostaria de voltar a ser adolescente com a maturidade que se tem hoje?! Pois esse sempre foi meu maior fetiche com a Malásia. Quando estive lá pela primeira vez era apenas um menino imaturo de 16 anos. Tinha medo de vestibulares e de meninas, era profundamente inseguro e estava sempre disposto a acreditar em quase tudo que me dissessem. Isso me impediu e muito de aproveitar plenamente meu intercâmbio. Mas desde então, quantas coisas me aconteceram! E eu estava de volta àquele lugar, com a maturidade que esses anos todos haviam me conferido. Meus amigos foram unânimes em dizer que eu não mudara fisicamente. Mas, por dentro, só eu tinha consciência do quanto minha cabeça havia mudado. Reconciliar-me com a Malásia: essa era minha meta.

Porém, como disse meu finado tio-avô: aquele lugar de nossa juventude nem sempre está lá inteiro, para nós. Se eu não havia mudado fisicamente, quase todos os meus amigos haviam mudado muito, e não só fisicamente. Um deles, que na escola tinha fama de ser rebelde, está trabalhando em um jornal pró-governo e é um ferrenho crítico da oposição. Outro, que vivia às voltas com sua família por ser homossexual e se deprimia cada vez mais por conta disso, agora é um feliz engenheiro químico trabalhando para as Petronas; ele tem um namorado estável, está financiando uma casa com o próprio dinheiro e, graças à sua independência financeira, já não teme tanto as escaramuças com seus familiares. Outro está trabalhando para uma organização do governo inglês, e viaja pelo mundo todo a trabalho (em uma dessas muitas viagens ele acabou conhecendo um amigo meu daqui de BH; mundo pequeno, não?!). Outro trabalha com plantações de óleo de palma sustentáveis e propôs que eu o ajudasse em um novo negócio de intercâmbio entre frutas brasileiras e malásias. Outro trabalhava em um cassino nas terras altas no interior do país – o único cassino legalizado na Malásia. Já um outro, que não encontrei dessa vez, havia virado traficante de drogas (profissão que dá pena de morte na Malásia), segundo me contou meu amigo que trabalha no jornal pró-governo.

Voltei também à escola na qual havia estudado. Era uma La Salle, escola fundada por missionários ingleses que tem sedes também aqui no Brasil. Visitei a cantina (tomei café da manhã lá), entrei nas salas de aula, relembrei o que fiz e o que vivenciei em cada parte daquele ambiente. Mas a cada passo que dava sentia um vazio danado por saber que aqueles tempos nunca vão voltar. Olhando pelo lado positivo, dei uma baita sorte de aparecer na escola justo num sábado em que estava acontecendo um evento esportivo. Fiquei feliz de encontrar uma grande parte de minhas ex-professoras lá – inclusive a de história! Uma delas me abraçou tão forte quando me viu que por um momento me esqueci que estava na Malásia. Todas ficaram surpresas de saber que eu também havia me tornado professor. Uma delas até me desencorajou de brincadeira, mas com um fundo de seriedade, dizendo pra eu mudar de ideia enquanto era tempo, já que ser professor é muito desgastante.

Outra coisa que havia mudado muito em minha cidade: eu não me sentia mais um alienígena. Há dez anos atrás, para onde ia todos me olhavam com estranheza. Agora, graças à globalização, ocidentais não são mais estranhos à população de Klang. Mas veja bem: Klang é uma cidade nos arredores da capital, região mais internacionalizada. Quando viajei para Kota Bharu, no nordeste do país, aí sim me senti na Malásia de verdade. O estado de Kelantan, do qual Kota Bharu é a capital, é meio que um pedaço do Oriente Médio no Sudeste Asiático. Quase toda a população é malaia/muçulmana, as placas e outdoors são escritos em alfabeto latino e arábico, os shoppings centers não têm cinemas e sexta-feira é feriado, dia santo para o islã. Apesar de ser a capital do estado, Kota Bharu tem ares muito mais provincianos do que urbanos. Parece até uma pequena vila que está começando a se tornar uma cidade média. Num dos shoppings da cidade, descobri que existe uma versão malaia daquela música do Cristiano Araújo (ou seria do Michel Teló? O sertanejo universitário é cheio de dissidências e disputas), "Bara bere". Vocês podem conferia-la nesse link: http://www.youtube.com/watch?v=iqEAKaIqhBc

Visitei o mercado central de Kota Bharu, onde se vendem comidas típicas e artesanato. Esse mercado é famoso por ter apenas vendedoras do sexo feminino. Lá comprovei o quanto é importante saber falar malaio se se quer visitar o país. Quase nenhum estrangeiro que visita ou mora na Malásia aprende malaio, haja vista que grande parte da população do país fala inglês - pelo menos no entorno da capital. Assim, os malaios ficam muito admirados ao verem um estrangeiro, sobretudo ocidental, falando malaio. Tanto que a moça de uma barraca fez desconto para mim em alguns produtos e até me deixou levar um a mais de graça. Isso sem falar que dava pra entender um pouco quando cochichavam sobre mim em voz alta. Fiquei surpreso com minha capacidade de ainda lembrar o malaio mesmo após tantos anos sem praticar.

Em Kota Bharu fiquei hospedado na casa de um casal aposentado que a alugava para turistas. Ambos eram muito amáveis. O dono da casa era mais quieto, mas a mulher era muito culta e amigável. Ela dizia ter uma imensa admiração pelo Lula e pela Dilma, especialmente tendo em vista as torturas pelas quais havia passado e a sua capacidade de se superar e virar presidente. Também afirmou que gostou muito de mim, e que iria orar para que Allah tocasse meu coração e eu me convertesse ao islamismo. E antes que você venha tirar conclusões precipitadas: essa foi a única vez que um muçulmano me sugeriu mudar de religião. Em geral, eles são extremamente respeitosos quanto à sua fé, seja lá qual for. Porém, a dona da pousada disse que havia gostado muito de mim, e que não iria ficar tentando me converter, mas que achava que eu tinha todas as características de um bom muçulmano. Quando eles me levaram ao aeroporto, ela me disse para lhe escrever um e-mail, caso tivesse tomado a decisão de me converter. E disse também que da próxima vez que me hospedasse lá, não precisaria pagar. Fiquei desconcertado com tanta cortesia. Não fiz nada além de agradecê-la muito, e prometer que iria pensar nas suas palavras.

Kelantan era um pedaço da Malásia que eu não havia visitado da primeira vez, mas confesso que foi uma de minhas melhores experiências naquele país. Em Klang, sempre tive muito mais contato com indianos e chineses, vindo a conhecer pouco a cultura malaia, que é, de fato, a que mais me fascinou. O islã chegou à Malásia no século XV, e a mistura entre elementos da cultura malaia pré-islâmica e elementos da cultura árabe-muçulmana gestou uma civilização e uma história sem pares. Algo digno de admiração e muito estudo.

Dois dias após voltar de Kota Bharu foi a vez de conhecer Cingapura, uma pequena ilha ao sul da Península Malaia que fez parte da Malásia entre 1963 e 1965, mas depois se separou. Se Kelantan é um pedaço do Oriente Médio, Cingapura é um pedaço da Europa na Malásia. Todas as placas em inglês (mas também em chinês, malaio e tâmil), transporte público de primeira, ruas limpinhas e um monte de atrações turísticas, como parques temáticos, safáris e coisas do tipo. Enfim, Cingapura é a Disneylândia do Sudeste Asiático.

Eu, porém, fiquei hospedado em um hostel numa área não muito nobre dessa cidade-Estado. Era a região de Geylang, área famosa por concentrar inúmeras casas de prostituição, que é legalizada no país. Quando chegava do centro da cidade à noite e passava perto das casas, os recrutadores logo me abordavam: “Hey, Mr. John, Mr. John, come! I have girl for you!” (embora o significado da palavra “girl” fosse meio ambíguo naquele contexto). Enquanto aqui no Brasil chamamos os estrangeiros de gringos, em Cingapura eles chamam os ocidentais de Mr. John, talvez por nos associarem automaticamente aos americanos. Já na Malásia, curiosamente eles chamam os ocidentais de Mat Salleh (abreviação de Datu Muhammad Salleh), um rebelde de Bornéu que liderou uma rebelião contra o domínio britânico no século XIX. É como se os peruanos resolvessem chamar os espanhóis de Tupac Amaru ou os haitianos chamar os franceses de Toussaint Louverture.

Voltando de Cingapura, faltava apenas um dia para meu retorno ao Brasil. Foi com extremo pesar que desci no aeroporto internacional de Kuala Lumpur para abandonar a Malásia pela segunda vez. Enquanto aguardava para embarcar, vi algo que nunca havia visto nem em um ano na Malásia: um judeu. Ele estava sentado mexendo no laptop, provavelmente aguardando seu voo. Aliás, uma curiosa combinação entre a vitória alemã na Copa e as ofensivas israelenses em Gaza gerou uma onda de antissemitismo e de apologia ao nazismo na Malásia que acabou transbordando para o Facebook. Houve casos de personalidades políticas e artísticas do país postando frases de apoio a Hitler e ao nazismo. Mesmo um amigo meu muçulmano trocou sua foto de capa do Facebook por uma foto de Hitler, ao lado de uma suástica.

O governo da Malásia não reconhece o Estado de Israel e é um grande apoiador da causa palestina. Tanto que, até há pouco tempo atrás, cidadãos da Malásia eram proibidos de voltar ao país caso seu passaporte tivesse um carimbo israelense. Creio que é justamente a ausência de contatos com judeus um dos responsáveis por deixar tantos malaios alheios ao que foi o nazismo e o holocausto, levando-os a essas demonstrações bizarras.

Quando estava me dirigindo ao portão de embarque e apresentei meu passaporte ao policial, ele leu meu sobrenome e brincou: “Alves de Paula Lima... Not Gustavo Lima, huh?”. Apenas ri e disse: “Oh, even here that guy is famous?”. E foi com essa conversa pitoresca que concluí minha segunda experiência na Malásia.

Ao fim e ao cabo, Rubem Alves tinha razão: quando voltamos a um lugar após muito tempo, ele não é mais o mesmo. Mas às vezes ele pode ser ainda melhor do que da primeira vez em que estivemos, especialmente quando aqueles a quem reencontramos mudaram para melhor. Especialmente quando nós mesmos mudamos para melhor. E me arrisco a dizer que aproveitei mais a Malásia nessas breves duas semanas do que em todos os 12 meses que perambulei por lá.

Voltei triste, mas feliz: havia me reconciliado com a Malásia.

2 comentários:

maria neusa guadalupe disse...

Allievo querido,adoro sua prolixidade....através dela viajei à Malásia e conheci todos os seus encantos...obrigada por compartilhar sua viagem conosco...beijos orgulhosos e amigos.

marilene veras disse...

Marcelo mergulhei contigo em cada momento vivido...vc tem verve e maestria para nos fazer voar junto contigo na imaginação. Marilene Veras