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sábado, 4 de janeiro de 2014

Caio, o estudante de cursinho politizado

Caio é um jovem estudante de 18 anos de idade de Belo Horizonte. Ele se formou no ensino médio em uma excelente escola particular no fim de 2012 e tentou vestibular para medicina. Infelizmente, sua pontuação no ENEM não foi boa o suficiente. Agora ele é um aluno assíduo de um dos melhores cursinhos da cidade.

Caio passa quase todos os dias no cursinho. Assiste a todas as aulas que pode, anota tudo que consegue, pergunta tudo o que não sabe e até o que sabe. Caio não pode se dar ao luxo de fracassar novamente em sua empreitada, pois esse sempre foi o seu maior sonho: ser médico igual a seus pais. Ele acredita que seu curso de medicina lhe dará o conforto financeiro e a satisfação profissional que ele espera.

Caio só usa roupas de marca: Hollister, Abercombie, e tudo o mais que os homens na moda estiverem usando, sempre combinando com uma bermuda também da moda, em cujo bolso ele traz seu iPhone fabricado com mão de obra escrava chinesa. Seu porte físico de atleta, sua barba sempre por fazer e seu cabelo com gel completam o visual.

A jornada de Caio no cursinho começa cedo. No turno da manhã ele assiste às aulas. No intervalo, vai comer na cantina. Conversando com sua amiga, Caio resmunga impropérios contra o professor de química, dizendo que ele não domina o conteúdo direito, pois precisa consultar suas anotações durante a aula. Diz ainda que professor de cursinho tem que saber toda a matéria de cor, que não pode ficar inseguro nem fraquejar, e que professor assim é despreparado. Por isso, Caio nunca confia em seu professor de química.

Menos confiável ainda é o professor de história. Enquanto os outros professores passam fórmulas feitas, ensinam macetes, bolam truques e toda sorte de artimanhas para que os alunos não esqueçam o conteúdo na hora da prova, o professor de história fica se perdendo em reflexões fúteis e contorcendo-se em discursos complexos que não ajudam em nada pra passar no vestibular. A amiga de Caio argumenta de forma conciliadora, afirmando que o professor de história só está tentando fazer os alunos pensarem por si mesmos. Mas Caio retruca com seu azedume característico, alegando que aquele professor é marxista – igual a todos os professores de história formados na UFMG. Caio não quer reflexões ideologicamente fundadas em uma doutrina que matou milhões de pessoas, ele quer apenas as respostas certas para entrar no seu curso de medicina.

Caio já é um rapaz politizado desde seus tempos de ensino médio. Não raras vezes o jovem se meteu em quiproquós homéricos com seus professores e colegas esquerdistas nas aulas de Revolução Russa e Ditadura Militar. Aliás, quando o Brasil foi escolhido para sediar a Copa do Mundo, Caio bateu boca com seus colegas de escola que, alienados pela doutrinação marxista do MEC, apontavam para os vários inconvenientes sociais e econômicos da realização desse evento no Brasil. Caio contra argumentava que a Copa é uma excelente oportunidade para o crescimento, pois todo país que sedia o evento experimenta uma série de melhorias estruturais. “Só mesmo um bando de esquerdistas cegos pelo marxismo poderia ser contra a realização de uma Copa em seu país”, pensava.

Caio se interessa pela carreira de médico, mas também ama história. Ele complementa o conteúdo do cursinho com aquilo que lê nos guias politicamente incorretos de história que ele ganhou de aniversário de seus pais. Caio tem a coleção completa: os guias politicamente incorretos da história do Brasil, da América Latina e do mundo, e está pensando em comprar o da filosofia. Ele costuma levar um dos guias para ler no cursinho no intervalo entre seus estudos. Com os guias politicamente incorretos, Caio aprendeu que todos os seus professores de história mentiram para ele ao longo do ensino médio e continuam mentindo no cursinho. Lendo-os atentamente a fim de assimilar cada parágrafo, o futuro médico vai aos poucos depurando seu espírito do lixo marxista que tentaram lhe empurrar.

Caio não se deixa levar por tudo que seus professores e monitores de história dizem. Sempre que recebe alguma informação no cursinho, ele corre para seu guia incorreto para ver se é verdade. Não raro, quando estuda em grupo, Caio perde a paciência com seus colegas, alegando que suas opiniões estão erradas porque não batem com as do seu guia. Por fim, acusa-os de estarem se cegando com a doutrinação marxista em sala de aula. Seu professor de história já pediu a ele para buscar informações em outros livros, sites e revistas, mas Caio se recusa. Não quer correr o risco de cair em novas armações marxistas por aí. Assim, ele se agarra ao seu guia como a pedra de salvação diante de tantos meios de informação que querem enganá-lo.

Apesar de tudo, Caio não se considera um conservador. Para Caio, direita e esquerda são tudo a mesma coisa. Ele se considera um apolítico, pois diz que a política é suja, que os partidos políticos são sujos e que todas as instituições políticas são corruptas. Caio acha que o congresso e o senado devem ser fechados, que todos os partidos devem acabar e que deve haver uma grande renovação no cenário político nacional.

A princípio, Caio é um tipo simpático. Porém, graças a esses contratempos em sala de aula ele acaba espantando as pessoas ao seu redor. Mas Caio não se importa. Ele não está ali para se divertir ou para fazer amigos, apenas para passar em medicina. No elevador, na cantina, na sala de aula, onde quer que esteja, é muito raro não ver Caio de cara amarrada, preocupado com seus estudos, irritado com as aulas e professores que ele considera “muito fraquinhos” ou "muito marxistas".

Apesar de sua ortodoxia politicamente incorreta, Caio não é religioso. Isso porque ele aprendeu nas aulas de biologia que Deus não existe. Caio também não tem paciência para futebol. Apesar de sua família ser majoritariamente atleticana, ele raramente acompanha os jogos. Seu grande prazer sempre foi jogar handball, mas agora teve de parar para se dedicar integralmente aos estudos.

Caio é contra cotas de qualquer tipo, pois diz que os negros e pobres não são inferiores a ninguém e, por isso, têm condições de competir em pé de igualdade com qualquer um. Ele também fica iracundo ao saber dos programas do governo para aumentar o número de vagas nas universidades públicas. Para Caio, isso atenta contra os princípios mais básicos da meritocracia. A universidade federal é só para quem pode, e não para quem quer. Aumentar vagas pode contribuir para reduzir o nível da instituição e, consequentemente, manchar o diploma de Caio.

Quando vieram as manifestações de junho de 2013, Caio ouviu o chamado das ruas. Mesmo tendo pilhas de fórmulas a decorar e macetes para aprender, Caio abriu mão de seus estudos por um tempo e saiu às ruas com seus amigos vestindo verde e amarelo. E como não ficava ensandecido o rapaz ao ver movimentos sociais e pessoas ligadas a agremiações políticas protestando ao seu lado... "Todos oportunistas e egoístas", afirma Caio, porque lutam por interesses particulares. Para ele, a única bandeira permitida nas manifestações deveria ser a bandeira do Brasil, pois era mais democrática e representava todos. Por isso ele era sempre o primeiro a puxar os gritos de “aqui não tem partido!” e “abaixa essa bandeira!”. Seus cartazes não ficavam por menos: “foda-se a Copa!”, “não quero dinheiro pra Copa, quero dinheiro pra saúde e educação!” e “enfia a Copa no cu!”. Caio acha um absurdo um governo dar tanta atenção à Copa e deixar de lado outros problemas urgentes, como saúde, educação, moradia, transporte e violência.

Caio acabou de fazer ENEM e dessa vez está confiante em sua nota! Nem isso, porém, consegue dar um jeito na cara torta de nosso futuro médico. Ele teme que, quando entrar na faculdade, terá de assistir aulas junto com uma leva de alunos despreparados que se beneficiaram com a expansão das vagas. Caio não quer ver a qualidade de seu curso de medicina decrescer vertiginosamente. Além do mais, para a infelicidade de Caio, os gritos que ele deu nas ruas foram ouvidos pelas autoridades: o governo decidiu contratar médicos estrangeiros a fim de suprir as áreas do país mais carentes de profissionais de saúde. Caio acha isso tudo um tremendo absurdo, pois esses médicos estarão recebendo salários parcos e roubarão o seu emprego quando ele estiver formado. Isso sem contar no absurdo ainda maior de a vinda desses médicos estar financiando a ditadura cubana.

Após mais um dia de cursinho, Caio volta para casa de ônibus remoendo suas amarguras. No caminho, uma pequena movimentação na rua atrapalha o trânsito: são jovens se manifestando por melhores condições de moradia para famílias carentes de Belo Horizonte. Caio ridiculariza: “Bando de desocupados! Ficam bloqueando o espaço público em nome de interesses privados”. Percebendo que o caminho para casa será longo, ele se acomoda na cadeira e começa a ouvir música em seu iPhone sonhando com o dia que terá seu próprio carro e não precisará depender de transporte coletivo.

3 comentários:

Fabiano Veliq disse...

Pobre Caio....

Laís Marçal disse...

Tem um monte de Caios por ai... lamento

maria neusa guadalupe disse...

Bom ler vc novamente,nem que seja sobre o Caio tadinho....saudades,allievo querido